"Quando um gato invade a toca de um rato, ele não vai embora sem fazer mal nenhum. Eu sabia como aquela história terminaria. Ele me estupraria. Ele estupraria minha mãe. E nos mataria" Página 61
QUE MERDA DE LIVRO BOM DO CARAMBA!
Estou bastante satisfeito com a minha leitura desse livro, e minha satisfação não se dá apenas por eu não ter criado nenhuma expectativa positiva sobre ele, mas sim porque, além de me surpreender, a trama toda me deixou sem o poder de suspeitar de como tudo iria terminar.
A todo momento eu imaginava que as coisas voltariam a ser como no inicio: ratos se escondendo. Mas o livro de Gordon Reece é um espelho real e não pode ser levado como uma mera ficção.
Shelley era um rata. Uma garota covarde demais para dizer "chega" e fraca demais para dar um basta ao sofrimento que os outros a faziam passar.
Não muito diferente dela, sua mãe - uma advogada - também era uma rata.
A mulher havia sido usada pelo ex-marido e depois trocada por uma vagabunda qualquer. Em seu emprego, era a que mais trabalhava e a que menos recebia, fazendo o trabalho dos outros e sofrendo ataques e grosserias de seus chefes. Todos se aproveitando dela.
"Meu pai nos abandonou, deixou-nos lutando sozinhas por nosso sustento enquanto se esbalda com sua vagabunda de vinte e quatro anos. Eu fui tão agredida que precisei abandonar a escola e ter aulas em casa. Meu rosto estava tão marcado pelo ódio alheio. E, agora, dentre todas as casas que aquela bomba-relógio ambulante poderia invadir, a nossa foi a escolhida, justamente quando começávamos a construir uma nova vida, quando as coisas começavam a melhorar" Página 69
Shelley acabou por ser agredida violentamente por colegas de classe, e após o incidente, precisou deixar a escola e passou a ter aulas em casa.
Para fugir ainda mais de tudo aquilo, a garota e sua mãe decidem viver em algum lugar deserto, longe de tudo e de todos e acabam por ir morar no Chalé Madressilva, pois "estava ali, o som mais maravilhoso que existia: a total ausência do som".
Mas como poderiam pensar que viveriam protegidas se fossem para um lugar longe de tudo?
E foi nesse lugar, longe dos olhos e ouvidos de qualquer um, a não ser delas mesmas, que o gato apareceu. Entrou na toca dos ratos e resolveu brincar de uma espécie de "dança das cadeiras", mas o que ele não contava era que "até os ratos têm um limite".
Mais:
Se no nosso interior existe algo exigindo ser libertado, uma hora se soltara e, como uma fera de dentes afiados e garras assassinas, sairá quebrando todas as correntes.
Isso é o que acontece com Shelley e sua mãe, que haviam sido obrigadas a aceitar tudo da vida, mas o preso dentro do interior deles se soltou e quebrou todas as correntes.
O medo deixou de existir e o ódio tomou o lugar.
E os ratos deixaram de ser ratos
Ratos é um livro que dá para se identificar. Eu, por exemplo, já fui um Rato. E quem já não foi um Rato?
Esse livro não é mera ficção, mas, talvez, meras coincidências.
Alguns trechos:
"... mas foram necessários meses de bullying até que eu finalmente compreendesse que eu era aquilo: um rato, uma rato humano" Página 33
"Eu não tinha dúvida do que escutara e do que seria: havia alguém na casa" Página 60
"Eu já não seria vitima de ninguém. Nunca mais" Página 237